Diagnóstico precoce do câncer bucal pode evitar sete mil mortes por ano causadas pela doença, afirma especialista

Em entrevista ao Conselho Federal de Odontologia (CFO), o Cirurgião-Dentista especialista em Estomatologia, Fábio de Abreu Alves, explica que apesar dos avanços em tecnologia para o tratamento do câncer bucal, o Brasil ainda carece de investimento em campanhas de conscientização para identificar a doença em estágio inicial.

Segundo o Cirurgião-Dentista, a chance de cura do câncer de boca com o diagnóstico precoce é acima de 95%, o que reverteria à alta taxa de mortalidade provocada pela doença no país: sete mil pessoas morrem por ano com a doença. Do contrário, quando os sintomas são identificados em estágio avançado, a chance de cura cai para 45% dos casos. A falta de conhecimento sobre a doença é o principal responsável pelas mortes.

Por se tratar de uma doença silenciosa, esclarece o Estomatologista, o desafio está justamente em identificá-la em estágio inicial.  Fábio de Abreu Alves assegura que ela apresenta pouca ou nenhuma sintomatologia, o que reforça, ainda, a necessidade da consulta odontológica com periodicidade a cada seis meses, independente do surgimento de sintomas.

 – Com mais de 14 mil novos casos de câncer bucal no último ano, qual o papel do Cirurgião-Dentista na prevenção e diagnóstico da doença?

 O Cirurgião-Dentista possui um papel fundamental em todas as fases na identificação e tratamento do câncer bucal, pelo fato de estar relacionado diretamente com o diagnóstico de boca. Nós examinamos e, consequentemente, se encontrarmos alguma lesão suspeita, participamos do tratamento dessa doença também. Quando o paciente é tratado por um cirurgião de cabeça e pescoço, fazemos a reabilitação desse paciente com prótese e/ou implantes, em alguns casos o paciente também é submetido à radioterapia ou quimioterapia. Nós fazemos análise da cavidade oral, removemos os focos infecciosos, para assim, evitar efeitos colaterais.

– Qual a periodicidade ideal de retorno odontológico do paciente?

Em geral, é recomendado que as pessoas procurem o Cirurgião-Dentista para avaliar a boca e a saúde bucal a cada seis meses, ou seja, duas vezes ao ano. Se o paciente apresenta lesões suspeitas, por exemplo, Leucoplasias, que são lesões com potencial de materialização do câncer bucal, essa visita regular deve ser a cada três ou quatro meses. No caso de pacientes que já foram tratados eles devem ter avaliação mais próxima, a cada três ou quatro meses também.

– Quais são os principais sintomas do câncer bucal?

Em geral, o câncer bucal em seu estágio inicial não apresenta sintomatologia, por isso, a importância de procurar um Cirurgião-Dentista com frequência. Por exemplo, placas brancas, placas vermelhas, pequenas úlceras, podem ser visualizadas logo no início e, consequentemente, a possibilidade de cura é muito grande. Pacientes que têm diagnóstico precoce com tumores iniciais, a chance de cura é acima de 95%. Quando um paciente apresenta alguma sintomatologia como dor ou dificuldade de mover a língua, que são dores mais avançadas, a chance de cura cai para 45%. O câncer de boca em seu estágio inicial é uma doença silenciosa que tem pouca ou nenhuma sintomatologia, já nos estágios mais avançados pode apontar dores. Quanto mais avançada a doença, as feridas vão crescendo.

– Qual a maior incidência da doença atualmente no Brasil? 

 O câncer de boca está diretamente associado com pessoas que fumam e bebem. O fator mais associado ao câncer é o tabaco (o cigarro), pessoas que fumam por muitos anos, 30 ou 40 anos, e ingerem a bebida alcóolica, que tem um fator promotor junto com o tabaco, aumentam as chances de ter a doença. Se associar a bebida com o cigarro, as chances aumentam ainda mais. As maiores vítimas dessa doença são homens acima de 50 anos, no entanto as mulheres fumantes também somam às estatísticas. Além disso, pesquisas recentes têm apontado o HPV (Papiloma Vírus Humano) como um fator causal também do câncer de boca. O HPV está mais relacionado às regiões posteriores à boca, regiões de palato mole e amídalas, e na base da língua (orofaringe). Esses estudos apontam, ainda, a inclusão de pacientes mais jovens com incidência desse câncer.

 – É possível sinalizar avanços no combate ao câncer bucal?

Infelizmente, os dados estatísticos não são muito animadores. Se comparar as décadas entre 1960 até 1990, com os dados atuais, não obtivemos muitas mudanças. No Brasil, cerca de 70% do diagnóstico acontece de forma tardia. Em relação à tecnologia, temos formas melhores para detectar a doença. Mas a tecnologia funciona muito mais no tratamento, como exames de imagem que ajudam a identificar metástase de pescoço, algumas imagens podem mostrar infiltração dos tumores. Nós avançamos nas formas de tratamento, como no caso das cirurgias por meio de robóticas. Para o diagnóstico não temos grande avanço, o avanço maior é no tratamento em si.

– Em contexto mundial, qual país se destaca pela menor incidência da doença e por melhores tratamentos para combatê-la?

 O câncer bucal é uma doença de relevância, no Brasil é o 5º mais comum entre os homens, e no caso das mulheres está como 8ª colocação. Na Índia, principalmente por fatores culturais a incidência do câncer bucal é alta. O Betel, que é uma mistura com sementes de árvore e é colocada na bochecha é uma mistura extremamente cancerígena. A Índia, em específico, tem o índice mais elevado do câncer bucal, se comparado com o Brasil, os EUA e alguns países da Europa. A grande diferença está na procura dos pacientes. O diagnóstico é feito de forma mais precoce do que no Brasil. Nós temos que evoluir no âmbito do diagnóstico precoce, por meio da comunicação, divulgação na mídia, é preciso mudar esse cenário.

– Qual a perspectiva do câncer bucal no Brasil, tendo em visto as campanhas de conscientização junto à sociedade?

 No Brasil não temos campanhas que são realizadas de forma fixa, com periodicidade regular, para observar resultados promissores em relação ao diagnóstico do câncer de boca. Nós temos, por exemplo, durante a campanha de vacinação contra a gripe, em muitos centros que fazem essa campanha, Cirurgiões-Dentistas que avaliam a boca dos pacientes, que normalmente são pacientes acima de 60 anos. Ou seja, aquele público mais sucessível ao câncer bucal. Essas campanhas têm ajudado para identificação dessa doença, que faz sete mil vítimas todos os anos.

– No âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), qual o cenário ideal para combater a doença?

Na rede pública de saúde obtivemos grandes avanços nos últimos anos. Antes, os pacientes diagnosticados com câncer bucal ficava cerca de seis meses ou mais na fila para receber tratamento, hoje a realidade é outra. O Sistema Único de Saúde possui em sua rede os Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs), que disponibiliza especialistas em doenças da boca, que são os Estomatologistas, para diagnóstico e tratamento com maior celeridade. Hoje, o maior desafio é trabalhar para que a informação chegue ao paciente.

Por Michelle Calazans / Ascom CFO
imprensa@cfo.org.br