Segurança do Paciente: CFO acompanha de perto construção da regulação da Anvisa em prol da biossegurança odontológica

No Dia Mundial da Segurança do Paciente, o Sistema Conselhos destaca a importância da futura RDC da Anvisa e reforça as medidas a serem tomadas na rotina clínica dos consultórios.

O Conselho Federal de Odontologia (CFO) tem acompanhado de perto a evolução dos trabalhos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a construção da futura RDC que tratará das Boas Práticas de Funcionamento para Serviços que prestam Assistência Odontológica no Brasil. A regulação sanitária, específica para o setor, deverá ser um marco para maior segurança do exercício da Odontologia e, principalmente, para ampliação dos mecanismos de proteção do paciente.

 

Neste Dia Mundial da Segurança do Paciente, celebrado anualmente em 17 de setembro, o CFO destaca a importância da futura RDC, elenca as principais normas relativas à biossegurança odontológica em vigor no país e reforça as medidas a serem tomadas pelos cirurgiões-dentistas para o exercício profissional com foco em práticas seguras de atendimento.

 

“Entre as principais missões institucionais do Sistema Conselhos de Odontologia destacam-se a fiscalização do exercício da profissão e a proteção da população. Portanto, o Dia Mundial da Segurança do Paciente é uma data fundamental para reforçarmos a importância das medidas e protocolos de biossegurança em consultórios e clínicas odontológicas de todo país. Essa é uma questão a que estamos atentos e em constante alinhamento com os órgãos como a Anvisa e o Ministério da Saúde”, destaca o vice-presidente do CFO, Nazareno Ávila.

 

Ao longo de 2025, o CFO participou de diversas reuniões para debater a Consulta Pública 1.301/2024 lançada pela Anvisa para tratar da normatização dos Requisitos de Boas Práticas de Funcionamento para os serviços que prestam Assistência Odontológica no país.  A ação foi necessária porque, segundo esclareceu a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a regulação sanitária federal no campo da Odontologia atualmente é estabelecida por normas aplicáveis de forma transversal a todos os serviços de saúde, não existindo uma abordagem sanitária federal mais específica voltada exclusivamente para o setor odontológico.

 

Em resposta à consulta, o CFO reuniu relatórios desenvolvidos pelos 27 Conselhos Regionais (CROs) de todo o país e encaminhou um documento consolidado pelo Grupo de Trabalho de Assistência Odontológica. No total, a Anvisa recebeu 664 sugestões encaminhadas por cirurgiões-dentistas e entidades ligadas à Odontologia. Agora, o órgão trabalha na consolidação técnica das contribuições recebidas na CP 1301/2024, com prazo estimado até janeiro de 2026. Após isso, seguirá para análise e deliberação da DICOL/Anvisa antes da publicação final.

 

A cirurgiã-dentista Ana Clara Ribeiro Bello dos Santos, que é especialista em Regulação e Vigilância Sanitária e servidora da Anvisa, participou da Consulta Pública, explicou os conceitos a partir dos quais ela foi conduzida. “De maneira simplificada, os principais pontos para garantir a segurança do paciente nos serviços odontológicos, assim como para os demais serviços de saúde, consistem em compreender o conceito da segurança do paciente e sua relação com a qualidade assistencial, promover o desenvolvimento de uma cultura de segurança e incorporar o gerenciamento de risco à rotina da prática profissional”.

 

Normas em vigor

Na Odontologia, de forma geral, a segurança do paciente depende tanto da estrutura física das clínicas e consultórios quanto das condutas e protocolos seguidos pelo profissional e sua equipe. Desta forma, até que a futura RDC seja publicada, os cirurgiões-dentistas devem estar atentos às atuais normas em vigor. Entre elas está, por exemplo, a RDC n°63 de 2011 da Anvisa, que estabelece as Boas Práticas de Funcionamento (BPF) nos serviços de saúde, as quais devem se basear na gestão da qualidade do serviço prestado e incluem o gerenciamento dos riscos para a segurança do paciente.

 

Além disso, também é importante que o profissional esteja atento à Portaria GM/MS n° 529 de 01 de abril de 2013, do Ministério da Saúde, que criou o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). O documento destaca a importância do gerenciamento de risco como prática de rotina na atividade profissional e da promoção da cultura de segurança com ênfase no aprendizado e aprimoramento organizacional, engajamento dos profissionais e dos pacientes na prevenção de incidentes.

 

De maneira a contribuir para uma assistência segura, o PNSP apresenta ainda como uma das suas estratégias a elaboração de guias, manuais e protocolos e o apoio à implementação das práticas de segurança descritas nos serviços de saúde. Dessa forma, a Portaria MS n° 1377 de 9 de julho de 2013 aprovou os Protocolos Básicos de Cirurgia Segura, Prática de higiene das mãos em serviços de saúde e Prevenção de úlceras (lesões) por pressão (sendo esse último não aplicável à assistência odontológica). Outros três protocolos foram aprovados na Portaria MS n° 2.095, de 24 de setembro de 2013: Prevenção de quedas, Identificação do paciente e Segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos. 



Para operacionalizar o PNSP, a ANVISA publicou a RDC n° 36/2013, que estabelece a obrigatoriedade de instituição do Núcleo de Segurança do Paciente- NSP para os serviços de saúde públicos, privados, filantrópicos, civis ou militares e aqueles que exercem ações de ensino e pesquisa, tendo como exceções os consultórios individualizados, laboratórios clínicos, os serviços móveis e de atenção domiciliar.

 

Além disso, em 2025, a Anvisa incluiu no Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), no Módulo Assistência à Saúde do sistema Notivisa, uma lista específica de incidentes relacionados a falhas na assistência no âmbito da Odontologia. Dessa forma, atualmente, os NSP dos serviços odontológicos que estão sob o escopo da RDC n° 36/2013 devem notificar incidentes relacionados à assistência à saúde, incluindo os incidentes específicos relacionados a falhas na assistência odontológica.

 

Ações na prática clínica

O cirurgião-dentista, presidente da Câmara Técnica do Conselho Regional de Odontologia do Espírito Santo (CRO-ES) e membro titular sênior do Colégio Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial, José Renato Costa, destaca que, para que a segurança do paciente no atendimento odontológico seja eficaz, esta precisa englobar um conjunto de práticas, protocolos e atitudes que evitem danos desnecessários ao paciente.

 

“A higienização, biossegurança, esterilização adequada dos instrumentais, o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), desinfecção das superfícies entre cada atendimento, o descarte correto de resíduos perfurocortantes e contaminados, a estrutura física e equipamentos, consultório acessível, bem iluminado e ventilado, equipamentos odontológicos em perfeito funcionamento e a presença de kits de emergência estão entre essas medidas”, esclarece.

 

Também devem ser realizados o controle de infecções através do fluxo de esterilização padronizado com limpeza, secagem, empacotamento, esterilização e armazenamento, assim como o monitoramento biológico e químico da esterilização, além da disponibilização de álcool gel. Ainda são essenciais os cuidados com a documentação e protocolos mantendo os prontuários atualizados, os termos de consentimento informado e esclarecido devidamente assinados e os protocolos de atendimento a emergências médicas disponíveis.

 

“Uma anamnese detalhada, identificação das condições sistêmicas relevantes, a solicitação de exames complementares quando necessário, o reconhecimento de fatores de risco no ambiente clínico (infecção cruzada, falha de equipamentos, uso inadequado de materiais), a observância rigorosa de protocolos de esterilização e desinfecção, o uso adequado da paramentação, são fundamentais nos atendimentos”, reforça José Renato Costa.

 

Além disso, os profissionais devem realizar o manuseio e descarte seguro de resíduos perfurocortantes e materiais contaminados, assim como a higienização correta das mãos e superfícies. As práticas clínicas seguras, com observância das técnicas baseadas em evidências científicas, a aplicação dos preceitos farmacológicos (doses, validade, integridade, indicação e contra indicação de fármacos) e prevenção de acidentes (engasgos, aspiração e queimaduras) são também de extrema importância.

 

Confira as principais medidas a serem tomadas com foco no paciente:

 

Anamnese: coleta do histórico médico e odontológico, uso de medicamentos, alergias e doenças sistêmicas; esta deve ser atualizada a cada consulta para prevenir complicações.

 

Prontuário odontológico: reúne exames, diagnósticos, planos, condutas e evolução clínica; deve ser físico ou eletrônico, completo, legível e organizado.

 

Plano de tratamento: apresenta alternativas, etapas, tempo e custos e informa as decisões que serão tomadas ao paciente.

 

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE): deve ser assinado pelo paciente ou responsável e garante autonomia ao autorizar procedimentos após esclarecimento de riscos e benefícios.

 

Exames complementares: radiografias, fotografias, tomografias, modelos de estudo, exames laboratoriais, etc., auxiliam no diagnóstico e planejamento. Quando arquivados, devem ser identificados e datados.

 

Receitas e prescrições: devem incluir dados do profissional, paciente, fármaco, dose, posologia e data, prevenindo erros de medicação.

 

Atestados odontológicos: devem ser claros, objetivos, verdadeiros e precisam justificar os afastamentos ou faltas.

 

Termos específicos: incluem de Recusa, de Responsabilidade e de Alta.

 

Comunicação formal: é obrigatória em caso de interrupção do tratamento pelo profissional, devendo ser enviada por AR ou e-mail formal, conforme Código de Ética Odontológico e Código de Defesa do Consumidor.

 

Bem-estar do cirurgião-dentista

 

Para garantir um atendimento seguro e íntegro ao paciente, é importante também que o cirurgião-dentista usufrua de um ambiente propício e adequado para desenvolver seu trabalho. Sendo assim, alguns pontos precisam ser seguidos: postura ergonômica para reduzir falhas por fadiga; capacitação contínua pela atualização em protocolos de biossegurança, emergências médicas e novas técnicas; treinamentos periódicos da equipe em suporte básico de vida (SBV); entre outros.

 

O uso dos EPIs também são um ponto importante, sendo que na Odontologia, os principais são: luvas, máscaras, óculos ou protetor facial, gorro, jaleco de manga longa e, em alguns casos, protetor auricular. “Para os profissionais, eles funcionam como barreira contra fluidos biológicos e patógenos como HIV, hepatite B e C e tuberculose, além de evitar acidentes ocupacionais; e ainda trazem segurança jurídica, pois demonstram o cumprimento das normas de biossegurança”, pontua o cirurgião-dentista José Renato Costa.

 

Histórico do Dia Mundial pela Segurança do Paciente

A especialista em Regulação e Vigilância Sanitária, Ana Clara dos Santos, explica que o movimento mundial pela segurança do paciente teve início com a publicação do relatório “Errar é Humano: construindo um sistema de saúde mais seguro (To err is human: building a safer healh system) em 1999, pelo Instituto de Medicina- IOM dos Estados Unidos da América – EUA.

 

“O documento evidenciou a importância de um cuidado em saúde mais qualificado e seguro ao divulgar que nos EUA ocorriam cerca de 44 a 98 mil óbitos a cada ano, atribuídos a eventos adversos (EA) em serviços de saúde. Os EA são definidos no documento da OMS, intitulado “Estrutura Conceitual para Classificação Internacional da Segurança do Paciente”, como incidentes que resultam em danos ao paciente”, explica a cirurgiã-dentista.

 

Após a repercussão do relatório do IOM- EUA, os serviços de saúde passaram a ser reconhecidos como ambientes inseguros e, por conta disso, países de todo o mundo se mobilizaram para desenvolver ações para a redução dos riscos à assistência à saúde. Em 2004, foi instituída pela OMS, a Aliança Mundial para a Segurança do Paciente (World Alliance for Patient Safety), que tem o Brasil entre os signatários e cujo objetivo é estimular e auxiliar os estados membros a promoverem a melhoria contínua da segurança do paciente e da qualidade dos serviços de saúde.