O adereço exige cuidados odontológicos redobrados, pois pode causar infecções, retração gengival, fraturas dentárias e dificuldades na fala e mastigação.

Os piercings são adornos corporais com origens ancestrais, sendo que seu uso tinha diferentes significados nas antigas civilizações. Nos dias atuais, possuem finalidade estética e podem ser encarados como expressões de rebeldia, liberdade, atitude ou estilo. No entanto, é importante lembrar que o adereço requer cuidados na hora da colocação e, posteriormente, uma rigorosa rotina de higienização por parte dos usuários. No caso dos piercings bucais, a atenção deve ser redobrada.
Por esse motivo, o programa CFO Esclarece faz um alerta sobre os riscos do piercing de boca e destaca os cuidados que sua utilização requer.
O tesoureiro do Conselho Federal de Odontologia, Élio Silva Lucas, pós-graduado em Odontologia Legal e Odontologia do Trabalho, ressalta que, embora a utilização dos piercings seja muito comum, especialmente entre os jovens, é importante que as pessoas se informem adequadamente antes da instalação.
“O paciente deve estar ciente dos cuidados necessários para escolha do modelo mais adequado e definição do local de instalação, assim como para assegurar a correta cicatrização da perfuração. Além disso, as pessoas devem conhecer os sinais de alerta para possíveis complicações e saber ainda quais as medidas preventivas a serem tomadas para manutenção desses adornos a longo prazo”, complementa.
Entenda os riscos da utilização do piercing bucal
A cirurgiã-dentista e mestre em Estomatologia, Fabiana Quaglio, esclarece que a utilização de piercings orais não é isenta de riscos à saúde. Ela ressalta que a boca, sendo um ambiente úmido e comumente habitado por bactérias, aumenta o risco de infecções após a perfuração, que pode ser feita nos lábios inferiores, superiores, freios linguais e labiais, língua ou região perioral, que é caracterizada pela área do entorno dos lábios.
“O acúmulo de placa bacteriana no local de perfuração, assim como no próprio adereço, pode levar a infecções locais intensas causando dor, sangramento e mau hálito e, em casos mais severos, necrose tecidual. Além disso, não existe piercing seguro, mas, sim, locais menos arriscados para realizar a perfuração, distantes de terminações nervosas, veias e artérias, de acordo com as variações anatômicas de cada indivíduo”, complementa Fabiana Quaglio.
Entre os principais riscos dos piercings estão as reações alérgicas, desgaste do esmalte dos dentes, fraturas dentais, retração gengival e lesões traumáticas em tecidos moles, como hiperplasias, fibromas e úlceras, além de lesões brancas, como leucoplasias, líquen ou reações liquenoides; e proliferações fúngicas, entre outros. Há ainda a possibilidade de acidentes graves que levam ao risco de morte por asfixia, com a broncoaspiração da “joia”, caso venha a se soltar dentro da boca.
Além disso, quando os piercings não são higienizados de forma correta, pode haver o desenvolvimento de infecções locais ou até mesmo sistêmicas, entre elas a gengivite que pode evoluir para a periodontite e levar à perda do elemento dental. Outra complicação grave que pode ocorrer em casos de infecções severas é a contaminação ou disseminação sistêmica do quadro infeccioso, levando até a endocardites bacterianas. Danos no local da perfuração, como paralisias ou parestesias, sangramento excessivo e dificuldades em exames odontológicos são outros possíveis problemas que o adereço pode causar.
A utilização dos piercings orais ainda pode interferir na função normal das estruturas fisiológicas da cavidade bucal, com consequências como salivação excessiva, dificuldade na pronúncia de palavras e problemas na mastigação e deglutição; explica Fabiana Quaglio, que também é Coordenadora Científica da Associação Brasileira de Cirurgiões Dentistas (ABCD) e Membro da Comissão da Mulher do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP).
Piercing de dente é seguro?
De acordo com Fabiana Quaglio, o piercing oral representa riscos à saúde independentemente do tipo ou local de instalação. Isso inclui até mesmo os chamados piercings de dente, ou “pontos de luz”, que são colados sobre o esmalte dental. A cirurgiã-dentista destaca que esses modelos, quando utilizados, devem ser de cristal polido, sem asperezas, rugosidades ou arestas que possam ferir o lábio.
Outro ponto de atenção no que se refere a este tipo de piercing é que no momento da instalação não devem ser feitos desgastes no dente sadio, sendo indicada apenas a colagem da “joia”, com uso de resinas próprias para essa finalidade. É importante ressaltar ainda que o modelo “ponto de luz” pode deixar o dente mais suscetível a infiltrações e à cárie no local de sobreposição ao esmalte.
Desta forma, a orientação é que os piercings de dente sejam instalados exclusivamente por um cirurgião-dentista e que o paciente mantenha uma boa rotina de consultas para verificação dos aspectos de higiene e preservação dos tecidos próximos à “joia”.
Cuidados gerais para os piercings orais
Entre os principais cuidados a serem observados para instalação de piercings orais está a escolha cuidadosa do profissional que vai fazer a perfuração, que deverá ter conhecimento aprofundado sobre a anatomia orofacial. Ressalta-se que esses profissionais não possuem autorização legal para injetar anestésicos no local da perfuração, o que torna o procedimento doloroso. Também deve-se observar se o estúdio de body piercing possui licença sanitária para funcionamento, tem condições de limpeza e higiene adequadas e utiliza material descartável.
É importante ainda que seja feita a escolha de uma “joia” de aço cirúrgico de qualidade para que sejam evitadas reações locais. O paciente ainda deve se lembrar sempre de que, tanto o lado visível da peça quanto o que fica em seu oposto podem causar lesões aos tecidos bucais. No caso dos piercings de lábio há inclusive o risco de a boca se rasgar, caso a peça seja puxada de forma acidental.
Fabiana Quaglio alerta que, por este motivo, deve-se priorizar peças polidas e de formato arredondado, sendo que as pontas que ficam em contato direto com a cavidade oral devem ser, de preferência, confeccionadas em silicone ou em borracha para que sejam evitados traumas em áreas como o assoalho bucal ou o céu da boca no caso de perfurações de língua. O mesmo cuidado deve ser tomado na escolha de adereços que fiquem diretamente em contato traumático, ou seja “batendo”, no palato durante a fala ou mastigação.
Para quem já possui um piercing na língua, nos lábios ou na região perioral é importante evitar manipulações com frequência e manter uma higiene oral rigorosa, que inclui a retirada e limpeza diária da peça. Além disso, ao menor sinal de desconforto, o paciente deve procurar um cirurgião-dentista e manter uma rotina regular de visitas ao consultório odontológico para acompanhamento.
“Se mesmo sabendo de todos os riscos que um piercing na boca pode causar, o paciente ainda decidir que vai usar um de qualquer forma, oriento que realize consultas frequentes a um cirurgião-dentista, para que o profissional possa realizar um acompanhamento minucioso e minimizar os riscos e danos. As visitas devem ser regulares a cada três meses”, finaliza a cirurgiã-dentista Fabiana Quaglio.