Lei Federal 11.340 de 2006 completa 19 anos de promulgação e significa avanços importantes na proteção das mulheres

A Lei Federal 11.340 de 2006 completa nesta quinta-feira, 7 de agosto, 19 anos de promulgação. A legislação, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, é considerada um avanço na proteção das mulheres brasileiras, uma vez que criou mecanismos para coibir e prevenir casos de violência doméstica e familiar. Nesse contexto, os profissionais da Odontologia são peças fundamentais na identificação e atendimento às vítimas, uma vez que o cirurgião-dentista está entre os profissionais mais capacitados a detectar lesões e traumas ocasionados por agressões.
Por este motivo, no decorrer deste mês, quando é realizada a campanha Agosto Lilás em todo país, justamente em razão do aniversário da Lei Maria da Penha, o Conselho Federal de Odontologia e os 27 Conselhos Regionais de todo país destacam a importância do cirurgião-dentista no atendimento às vítimas de violência doméstica, de forma que as mesmas possam ter as funções orofaciais e a estética dos sorrisos preservados. Os profissionais também são fundamentais no combate à violência, por meio da identificação e notificação compulsória de casos suspeitos.
“O cirurgião-dentista, por sua competência clínica, é capaz de identificar traumas e aferir se a fratura ou lesão é potencialmente fruto de violência doméstica, mesmo que a vítima apresente uma versão diferente. Ele deve atuar com grande sensibilidade clínica e olhar humanizado, características inerentes ao exercício da Odontologia, e fazer o acolhimento da paciente, prestando-lhe todo o atendimento necessário”, ressalta a conselheira federal do Conselho Federal de Odontologia, Sandra Silvestre.
Lesões e traumas orofaciais decorrentes de violência
O tesoureiro do CFO, Elio Silva Lucas, especialista em Odontologia Legal, explica que, frequentemente, vítimas de violência doméstica sofrem traumas graves na região orofacial, podendo haver fraturas e lesões em geral no maxilar, ossos, tecidos moles e arcada dentária. Essas mulheres frequentemente chegam aos consultórios odontológicos com perdas dentárias e lacerações de lábios e língua, havendo casos ainda de ferimentos na gengiva, palato e cantos da boca.
Nos episódios mais graves, quando há fraturas ósseas, geralmente as vítimas procuram por atendimento ambulatorial hospitalar, sendo atendidas pelos cirurgiões-dentistas especialistas em Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial. Muitas vezes, são necessárias cirurgias de reconstrução facial, com instalação de próteses e placas, de forma que possa ser assegurada não apenas a preservação estética do rosto da paciente, mas também as funções orais como fala, mastigação e deglutição.
“É muito comum que o agressor desfira golpes na região orofacial das vítimas, que provocam, além dos traumas e lesões em si, grandes impactos na autoestima dessas mulheres, uma vez que elas podem ter o rosto e o sorriso desfigurados. Dessa forma, a Odontologia possui uma função que vai além do atendimento clínico, proporcionando-lhes também dignidade”, esclarece Elio Silva Lucas.
Caso de mulher agredida com 60 socos evidencia problema
O recente caso de uma mulher agredida com 60 socos em um elevador em Natal (RN) no dia 26 de julho chocou o Brasil e voltou a chamar a atenção da sociedade e das autoridades para a importância do combate à violência doméstica. O episódio, registrado pelas câmeras de um elevador, resultou em múltiplas fraturas no rosto e maxilar da vítima. O caso também colocou em evidência o grande valor da Odontologia no atendimento a mulheres agredidas, inclusive com quadros clínicos graves envolvendo as estruturas orofaciais.
A paciente precisou passar por uma cirurgia de reconstrução facial, realizada na última sexta-feira, 1 de agosto, por uma equipe de especialistas em Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), coordenada pelo cirurgião buco maxilo facial Adriano Rocha Germano. O procedimento foi capitaneado pelo Dr. Kerlison Paulino de Oliveira e contou ainda com a participação de cirurgiões-dentistas residentes.
Notificação compulsória no combate à violência
A Lei Federal nº 13.931, de 10 de dezembro de 2019 tornou obrigatório a todos os profissionais de saúde, incluindo-se, portanto, os cirurgiões-dentistas, a comunicação à autoridade policial dos casos em que houver indícios de violência contra a mulher. A notificação compulsória precisa ocorrer no prazo de até 24 horas após a identificação do caso de suspeita de agressão.
A presidente do Conselho Regional de Odontologia de Sergipe, Anna Tereza Lima, explica que a denúncia deve ser realizada por meio do Sistema de Informação de agravos de Notificação (SINAN), ferramenta do Ministério da Saúde que coleta, transmite e divulga dados sobre doenças e agravos de notificação compulsória, incluindo violência.
“Muitas vezes, essas mulheres encontram-se subjugadas, sob constante ameaça e com baixa autoestima, condições que as impedem de buscar apoio. A notificação é o primeiro e importante passo a ser dado para que a vítima seja retirada da situação de violência. Posteriormente, é fundamental que ela seja atendida por uma ampla rede de apoio, dentro das mais diversas áreas, incluindo Saúde, Assistência Social, Segurança Pública e Justiça, com todo o acolhimento necessário e atenção para que ela não seja revitimizada nesse processo. Esse é o caminho inicial para que essa mulher tenha, de fato, condições de se reerguer”, destaca Anna Tereza Lima.
O que diz o Código de Ética da Odontologia
O Código de Ética da Odontologia garante ao paciente o direito à privacidade, sendo que, o artigo 9, institui como deveres fundamentais dos cirurgiões-dentistas zelar pela saúde e pela dignidade do paciente; além de resguardar o sigilo profissional. De acordo ainda com o artigo 14, fica constituída infração ética a revelação, sem justa causa, de fato sigiloso de que o profissional tenha conhecimento em razão do exercício de sua profissão. Porém, a conselheira federal do CFO, Sandra Silvestre, explica que a notificação compulsória, prevista em lei, não se enquadra em infração ética.
“A notificação dos casos suspeitos de violência é uma obrigação do cirurgião-dentista, tanto do ponto de vista legal, quanto do ponto de vista do exercício ético da profissão. Os colegas cirurgiões-dentistas devem estar cientes de suas prerrogativas e, principalmente, da importância de suas ações para o bem estar das vítimas que poderão ser identificadas pelas autoridades competentes, acolhidas e retiradas de situações graves de violência física e psicológica. Muitas dessas mulheres acabam sendo ainda vítimas de feminicídio, portanto, a denúncia pode fazer toda diferença para que uma vida seja salva”, conclui a conselheira federal Sandra Silvestre.