Estima-se que, em 2010, o Brasil terá 1 milhão de pessoas completamente sem visão devido ao problema.
Em 2010, o Brasil terá pelo menos 1 milhão de cegos vítimas do glaucoma. A doença, maior causa de cegueira irreversível no mundo, chega sem fazer alarde. Apenas 10% dos pacientes acometidos por ela apresentam sintomas, fato que acaba contribuindo para que o mal seja diagnosticado apenas em estágio avançado, quando a pessoa já perdeu grande parte da visão. Ou seja, em 90% dos casos o mal é traiçoeiro.
O glaucoma é uma neuropatia que atinge o nervo óptico. A doença não tem cura, mas pode ser controlada. Consequência, geralmente, da elevação da pressão intraocular (PIO), provoca privação da chamada percepção periférica. O não tratamento e a progressão do transtorno resultam na perda completa da visão. “O olho contém um líquido que circula em seu interior e deve ser escoado constantemente. Quando isso não acontece, a pressão nos globos oculares se eleva, provocando a morte das células do nervo óptico. O glaucoma é o resultado desse processo”, explica o oftalmologista do Hospital Oftalmológico de Brasília Juscelino de Oliveira. O médico alerta, no entanto, que a doença também pode ser causada por fatores congênitos, inflamatórios, pós-cirúgicos, medicamentosos, traumáticos, por doenças reumáticas e autoimunes e até por bronquite.
O tipo mais comum de glaucoma é o crônico e de ângulo aberto. O olho não fica vermelho, não arde, não dói e nem coça, mas a pressão está alta, e o nervo, se deteriorando aos poucos. Como a visão central não é afetada no início da doença, os discretos sinais da neuropatia passam despercebidos. Já o glaucoma de fechamento angular primário ou agudo é diferente. Nesse caso, ocorre um entupimento repentino da área na qual os líquidos que limpam e nutrem os olhos são escoados. O doente, então, apresenta dor, visão embaçada, vermelhidão e até náuseas, vômitos e mal-estar. “É uma urgência na oftalmologia. Por meio de intervenções cirúrgicas, restabelecemos a abertura imediata do ângulo para salvar parte da visão”, revela Juscelino. Esse tipo é recorrente entre os asiáticos (8% da população) e os esquimós (15%).
Parâmetros variáveis
O glaucoma é detectado por meio de um exame oftalmológico cuidadoso. O especialista deve estar atento ao histórico do paciente. “Não existe um teste específico que aponte o problema. Nos valemos de uma série de exames para confirmá-lo. Além disso, cada caso é um caso. Para alguns pacientes, a PIO na casa dos 21mmHg é tolerável, outros já apresentam o glaucoma com a pressão a 12mmHg. Na verdade, os parâmetros considerados normais variam de pessoa para pessoa”, observa o oftalmologista Edney Resende Moura Filho, especialista em glaucoma do Hospital Pacini.
Estatisticamente, o glaucoma é mais incidente em indivíduos com idade superior a 40 anos. “Mas, é importante destacar que, nessa faixa etária, os pacientes recorrem mais aos oftalmologistas devido a outros problemas, e a neuropatia acaba sendo diagnosticada. A verdade é que a doença pode surpreender pessoas mais jovens, com 20, 30 anos, ou mesmo crianças e adolescentes”, observa Juscelino. Existe, no entanto, um grupo mais vulnerável ao glaucoma. Descendentes de africanos e asiáticos, pessoas com histórico da doença na família, míopes e diabéticos têm mais chance de serem atingidos pelo mal.
O funcionário público aposentado Erivan Branquinho, 70 anos, soube que tinha glaucoma ao acompanhar o pai em uma consulta ao oftalmologista. “Aconteceu em 1961. Meu pai estava com a visão muito comprometida em decorrência dessa neuropatia. Passou os últimos oito anos da vida cego. O médico olhou para mim e alertou sobre a grande possibilidade de eu ter a doença também. A suspeita se confirmou, mas tive tempo para evitar a progressão. Recentemente, devido ao diabetes, o mal se agravou”, lamenta.
Sinais
A professora de educação artística Eva Lopes Tranqueira, 50 anos, levou um susto quando recebeu o diagnóstico. Ao notar que estava com dificuldades para ler, procurou um especialista. A pressão do olho estava extremamente alta e parte da visão foi perdida. “O médico indicou uma medicação que provocou alergia. Em busca de outro especialista que me deixasse mais segura, relaxei no tratamento e o problema se agravou”, revela.
Tanto Eva quanto Erivan se recuperam da cirurgia, um recurso para conter o glaucoma. Graças à evolução farmacológica e tecnológica, existem progressos no tratamento. Colírios hipotensores, medicamentos orais e venosos, laser e cirurgias retardam os efeitos da doença. Todo o arsenal promove a diminuição da PIO. “O indicado para cada caso depende do estágio da patologia. O ideal seria se conseguíssemos diagnosticar a pressão elevada antes da ocorrência do glaucoma. Aí sim, o mal seria prevenido”, garante Juscelino de Oliveira.
Infelizmente, porém, o glaucoma está em ascensão. “Em 1996, havia 5 milhões de cegos no mundo em decorrência da neuropatia. Hoje, quase 10 milhões não enxergam mais e 100 milhões são portadores”, enfatiza o médico. Os dois profissionais são unânimes: a resposta ao tratamento é individual e depende da adesão do paciente. Para algumas pessoas o colírio provoca vermelhidão e acaba gerando desconfiança. Outros esquecem de pingar o remédio ou têm limitações físicas para ministrá-lo. “Por esses e outros motivos, o laser ou a cirurgia podem ser a primeira opção. Semana passada, por exemplo, atendi um paciente com a PIO a 50mmHg. Tentamos até medicação venosa e não obtivemos êxito. A cirurgia preservou o que ainda não estava comprometido na visão dele”, completa o oftalmologista Moura Filho.
Fonte: Correio Braziliense – 03/11/09