Médicos brasileiros estão adotando a acupuntura para substituir a anestesia em algumas cirurgias, como as de hérnia inguinal (caroço perto da virilha), nódulos na tireoide e partos cesarianos e normais.
Ao contrário da anestesia tradicional (em que o paciente chega a perder temporariamente todos os sentidos), a analgesia com acupuntura tira a dor, mas mantém os outros sentidos ativos (como movimentos, pressão e calor).
A técnica é usada desde a década de 70, quando foram publicados os primeiros estudos chineses. Desde então, nenhum grande centro teve resultados publicados em revistas científicas internacionais.
A primeira cirurgia do gênero foi feita no país em 1978, no Hospital de Clínicas Pedro 2º (ligado à Universidade Federal de Pernambuco), pelo acupunturista Gustavo Sá Carneiro.
Carneiro reúne mais de cem casos -ele diz que teve de recorrer à analgesia tradicional em dois deles. Os primeiros resultados foram publicados na revista “Senecta”, em 1982.
“Faço cirurgias com acupuntura até hoje, mas ainda enfrento resistência porque a técnica é desconhecida”, diz Carneiro.
Médicos do Hospital de Base de São José do Rio Preto também estão adotando a técnica desde 2002 e reúnem mais de 30 casos. Os resultados ainda não foram publicados. “A técnica não substitui nenhuma outra, mas é mais uma opção”, diz a anestesista e acupunturista Ana Patrícia Moreira Lima.
Antes da cirurgia, o paciente é preparado para se acostumar ao ambiente cirúrgico e costuma passar por sessões de acupuntura em ambulatório.
A cirurgia é um pouco mais demorada do que a convencional -as agulhas levam cerca de 30 minutos para começar a fazer efeito anestésico-, mas a recuperação é mais rápida, com menos uso de drogas.
Durante o procedimento, as agulhas são colocadas em áreas como punhos, mãos, tornozelos e perto de onde será feita a incisão. Em seguida, são conectadas a um eletroestimulador.
“Essa estimulação manda uma mensagem ao cérebro, que passa a produzir os opioides endógenos [analgésicos naturais]. Assim, o paciente não sente mais dor”, afirma Lima.
O acupunturista Hong Jin Pai, presidente do Colégio Médico de Acupuntura do Estado de São Paulo e médico do Centro de Acupuntura do Hospital das Clínicas de São Paulo, diz que não utiliza o método porque ele não é totalmente eficaz.
Ele afirma que, em cirurgias de cabeça e pescoço, a taxa de sucesso é de cerca de 75%, e nas abdominais, de 50%. Os outros pacientes recebem anestesia porque não suportam a dor.
Para o cardiologista e acupunturista Evaldo Martins Leite, presidente da Associação Brasileira de Acupuntura, a técnica é vantajosa mesmo nos casos em que é necessário aplicar anestesia, pois o paciente receberá menos drogas por estar parcialmente anestesiado.
“O fato de diminuir a quantidade de anestésico é um ponto positivo. Mas a técnica enfrenta resistência dos próprios acupunturistas”, afirma.
Jin Pai também diz que o tempo de preparo do paciente limita o uso da técnica e que a acupuntura como anestesia só deveria ser recomendada para pacientes alérgicos. “Seria a última alternativa”, afirma.
O anestesista Carlos Eduardo Lopes Nunes, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, diz que a entidade não contraindica a acupuntura como anestesia cirúrgica, mas também não a ensina como método regular.
Segundo Nunes, a sociedade reconhece a aplicação da acupuntura como tratamento da dor crônica. Para o uso em cirurgias, entretanto, ele faz uma ressalva: diz que o procedimento deve ser feito exclusivamente por médicos anestesistas acupunturistas.
“Se o profissional tiver formação clássica e dominar a acupuntura, tudo bem, pois ele poderá mudar a técnica anestésica se for necessário.”
Fonte: Folha Online – 21/10/09